quinta-feira, 18 de novembro de 2010

*Airton Diniz - "livros e revistas ainda são imbatíveis"


Editor da maior revista de heavy metal do Brasil, a Roadie Crew, Airton Diniz é natural de São Paulo.
Formado em Ciências Econômicas, com especialização em Administração Financeira e Tecnologia de Informação, Airton entrou para o meio jornalístico em 1994 quando criou o fanzine Roadie Crew, que tinha como maior objetivo divulgar bandas e eventos no meio heavy metal. Em 1997 fundou a Roadie Crew Editora Ltda., constituída para possibilitar a profissionalização da revista que coincidiu com o lançamento do site (www.roadiecrew.com.br).
Como revista, a Roadie Crew se transformou em uma das maiores do gênero no mundo, e hoje é distribuída em todo território nacional e também em Portugal. Conversamos com Airton sobre jornalismo cultural. Confira a íntegra da entrevista.

Vitor Hugo: O que o levou a assumir o ofício de jornalista?
Airton Diniz: A necessidade de tomar a decisão entre desativar o então fanzine ou profissionalizá-lo, tornando-o uma publicação oficial. Foi quando constituímos a editora.

VH: Para você, qual a importância do jornalismo cultural?
AD: O jornalismo cultural é importantíssimo para a sociedade na medida em que registra o que acontece e divulga o trabalho e o pensamento de artistas das diversas áreas de criação (músicos, poetas, escritores, cineastas, teatrólogos etc).

VH: Em sua opinião, existe alguma forma de jornalismo que se apresenta como cultural, mas que na verdade não o é? Qual?
AD: O jornalismo cultural se concentra em assuntos do mundo as artes e da literatura, e qualquer tema que se enquadre nisso é assim caracterizado como jornalismo cultural. Não importa o gênero ou a qualidade do trabalho artístico que esteja em pauta.



VH: No meio jornalístico existe certo preconceito em relação à expressão "jornalismo cultural". O que você pode nos falar sobre isso?
AD: A sociedade é cheia de preconceitos; faz parte da fraqueza humana. E acho que existe preconceito para com outras áreas do jornalismo também, como contra o jornalismo esportivo, que é visto como uma espécie de “segunda linha” na profissão de jornalista. Mas isso é uma grande besteira. O que existe é jornalista de “primeira linha” ou jornalista de “segunda linha”, qualquer que seja a área de atuação.

VH: Você é editor de uma revista especializada em heavy metal, que é um estilo musical, um tipo de manifestação cultural. Você acha que nos grandes jornais do Brasil e do mundo falta espaço para esse tipo de manifestação?
AD: Não falta espaço nos grandes órgãos de imprensa, falta cultura e interesse de quem é responsável pelo espaço do jornalismo cultural nessas empresas. Quanto maior o órgão de imprensa, maior e mais “profissionalizada” (no sentido ruim da palavra) é a estrutura empresarial necessária, o que torna o veículo de informação muito parecido com uma fábrica de salsicha, onde entra matéria-prima e sai um produto que vai para a mesa do consumidor. A preocupação é que o produto seja vendável e dê bons resultados com as receitas vindas dos leitores e dos anunciantes. O jornalismo não especializado é sofrível em qualquer tipo de assunto, na maioria dos casos. Trabalhei minha vida inteira na área de Tecnologia da Informação e fui entrevistado várias vezes por jornalistas que não sabiam nada sobre o que estavam me perguntando e que não tinham a menor noção sobre o que eu estava respondendo. Em muitos casos eu chegava a pedir ao repórter para que pudesse ler o material antes da publicação, a fim de evitar erros ridículos na edição da matéria.

VH: Atualmente temos a internet como um dos mais importantes meios de comunicação de massa. Você acha que revistas, jornais, livros, enfim todo tipo de meio impresso, correm sérios riscos de ser extintos devido ao fácil acesso que a mídia virtual oferece?
AD: O impacto maior acontece com relação ao jornal impresso, que foi realmente mais afetado com a concorrência da internet pela agilidade na publicação e no acesso à noticia. Mas quando se quer mais profundidade e detalhes sobre algum assunto, o livro e a revista ainda são imbatíveis. Além disso, muita gente tem o costume de colecionar material impresso e matérias de algum interesse em especial.

VH: Ainda falando da internet, temos muitos mais sites especializados em cultura, principalmente música, do que revistas. Em sua opinião, a que se deve o fato da mídia virtual dar mais espaço para a cultura do que a mídia impressa?
AD: Basicamente o baixo custo e a facilidade que a tecnologia proporciona para se fazer uma revista eletrônica. Produzir uma revista em papel requer o envolvimento de uma indústria gráfica, de matéria-prima em grande escala (papel, tinta) e de uma forte estrutura de distribuição. Para fazer um site basta ter um computador e uma empresa de hospedagem, que em alguns casos nem tem custo.

VH: Os fãs de heavy metal costumam tomar posições radicais em relação às bandas quando estas mudam seu estilo. Como é a relação do leitor com a mídia especializada?
AD: É muito semelhante ao comportamento deste mesmo público em relação às bandas. Se uma publicação especializada opta por mudar o perfil da sua linha editorial, tentando atingir um público maior, isso pode desagradar aos leitores mais fiéis ao gênero, que encaram as mudanças como uma espécie de “traição”.

VH: Em sua opinião, todo jornalismo é cultural?
AD: Quando feito com competência e profissionalismo podemos dizer que sim, no sentido de que a palavra cultura pode ser usada com relação aos padrões de comportamento, crença e visão sobre os valores materiais da sociedade. O jornalismo pode, e deve, ser instrumento de transmissão de conhecimento e não representar apenas o veículo de disseminação de informação volátil.

*Entrevista originalmente produzida para a disciplina Introdução às Técnicas Jornalísticas (2° semestre/2006),ministrada pela professora Socorro Veloso, do curso de jornalismo da UNIFAE, de São João Boa Vista/SP.

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